Alice -
“Poderia me dizer, por favor, que caminho devo tomar para sair daqui?”
Gato - “Isso depende bastante de onde você quer chegar”
Alice - “O lugar não importa muito…”
Gato - “Então não importa o caminho que você vai tomar”
Gato - “Isso depende bastante de onde você quer chegar”
Alice - “O lugar não importa muito…”
Gato - “Então não importa o caminho que você vai tomar”
Esta
passagem do clássico “Alice no país das
maravilhas”, de Lewis Carroll, é uma anedota que encerra em si um paradigma
da vida urbana: quem somos & o que queremos.
São questões quase metafísica, abstratas.
Ao mesmo tempo meio que óbvias: evidente que queremos
tudo, do bom e do melhor.
Bem estar físico-psiquico-social (definição de saúde
da OMS).
Ser bem sucedido em suas metas – quais sejam.
O problema é que não há fórmula mágica para atingir
nenhum delas.
São caminhos que se constroem no dia-a-dia.
Mas há certas perspectivas consensuais.
Para se tornar um talento em esporte, música e outras
expertises, existe a regra das 10.000 h
[1]
que se considera necessário esse investimento de tempo em treino, independente da
idade, para atingir excelencia, virtuosismo. Ainda que esta perspectiva seja questionável [2],
não há exatamente debate de que treinar e
estudar sejam necessários para performance.
De outra sorte, observamos comportamentos das espécies
na natureza que são intuitivos.
Andar, respirar, beber, comer.
A questão é que quando se sai da natureza e um ser é
transposto para o ambiente urbano, as coisas se tornam complexas.
Transitar por matas ou ambientes não urbanizados requer
atenção face a obstáculos frequentes imprevisíveis. Por outro lado, num
ambiente urbano, Rio de Janeiro por exemplo, talvez mais atenção seja até requerida
para evitar acidentes ao longo das vias públicas.
Respirar é necessário e involuntário. Oxigênio é
essencial. E se mora numa cidade de alto índice de poluição, não há o que fazer.
Usar máscaras tem limite de funcionalidade. E estética.
Beber também. Água é essencial. O problema é conseguir
água potável. Os rios urbanos são usualmente poluidos. Bebe-se portanto água tratada,
de abastecimento público. Ou água mineral, de fontes distantes. Ou ainda
refrescos, refrigerantes, dentre outras bebidas formuladas. As formulações não
são essenciais. Água sim. Isso de certo modo aprendemos com nossos pais e
responsáveis, ainda que muitos desvirtuem do caminho ideal. Mas não parece uma
questão muito complexa.
Comer é também essencial. Necessitamos de energia para
o organismo. Lipídeos e aminoácidos são macronutrientes que encerram
micronutrientes essenciais. Junto com carbohidratos, são fonte de energia.
Mas não somente energia. O ser humano tem necessidade
de diversas substâncias que ele mesmo não produz – micronutrientes essenciais
(minerais e vitaminas) - e são
necessários se obter de fontes exógenas, preferencialmente pela alimentação.
Comida é comida, mas não é tudo igual.
Quanto mais amido e açucares, por exemplo, menor a quantidade
de micronutrientes essenciais [3].
A falta de micronutrientes essenciais – lipídeos, aminoácidos,
minerais e vitaminas – é sabido estar relacionado com problemas no
desenvolvimento e declínieo de saúde. Tão essenciais que são suplementados em
diversas condições, como em caso de doenças metabólicas cronico-degenerativas ou
ainda em pacientes graves hospitalizados, ou ainda outros sob restrição
calórica (voluntária ou devido a por ex cirurgias bariátrica).
Entretanto, a suplementação “multivitaminica” (min
& vit) não está necessariamente suprindo as demandas diárias de
tantos micronutrientes essenciais, devido a fatores como a inadequação de dosagens das formulações
disponíveis, pela limitada absorção do “multivitamínico” comparado com alimento
in natura, e ainda sua composição e custo. Ou seja, mesmo
escolher um simples “multi” na farmácia não é tarefa simples.
Sob essa perspectiva, nota-se que comer deixa de ser
algo que deveria ser aparentemente trivial, ao menos em ambiente urbano.
Desta forma, diferente de Alice, ainda que saibamos
que caminho seguir, dependemos de alguem que nos indique o caminho.
Animais em seus habitats naturais não estudam para se
alimentar
Mas porque nós, seres urbanos, necessitamos tanto estudar para aprender a se alimentar ? Seriam
necessárias 10.000h, equivalentes a 27 anos, 1h/dia ? ou isso seria apenas para
se tornar um Chef três estrelas ?
Pensemos como se estivessemos na natureza. Desconfie,
pondere, modere se:
- vem em pacote, embalagens, com multiplos
ingredientes, com nomes químicos impronunciaveis, corantes, edulcorantes;
- parece algo inimitável de se fazer em domicílio com
um livro de receita e um mínimo de prática, e não um tratado de Engenharia de Alimentos
ou de Química Avançada;
- tem reivindicações de benefícios a saúde: baixo nisso,
alto naquilo, melhora isso, protege daquilo
E invista suas 10.000 h - sem contá-las - em feiras, cozinha com
boa música, em troca de receitas e fotos de seus pratos.
Parece um bom caminho.
E tempo vai passar voando.
E tempo vai passar voando.
[1] K. Anders Ericsson, Ralf Th. Krampe, and Clemens Tesch-Romer. The Role
of Deliberate Practice in the Acquisition of Expert Performance”. Psychological Review (1993), v 100, n 3,
363-406. http://projects.ict.usc.edu/itw/gel/EricssonDeliberatePracticePR93.pdf
[3] Luis Mauricio T R Lima (2017) “Subclinical Diabetes” An. Acad.
Bras. Ciênc. Epub May 04, 2017. http://dx.doi.org.1590/0001-3765201720160394